
Crônica da Cozinha – Socorro online
Por Manuel Alves Filho
Por entre corredores apinhados de produtos, o senhor, que aparenta ter 50 e poucos anos, titubeia. Pega as mercadorias, lê os rótulos e as devolve à gôndola, mantendo um ar de indisfarçável contrariedade. Cozinheiro que sou, tenho vontade de oferecer ajuda, mas me contenho. Intuo que o exercício da escolha da marca e do tipo de chocolate talvez seja útil para o aprendizado dele.
Incrível como, neste ano da graça de 2017, alguns homens ainda se sintam um tanto perdidos no momento de fazer compras nos supermercados sem a presença de suas companheiras.
O alegado sentido prático dos indivíduos do gênero masculino, se é que existe, parece constituir obstáculo a este tipo de atividade, que exige, além de conhecimentos sobre economia doméstica, macroeconomia, política, antropologia, matemática, física e química, uma destacada atenção, uma boa capacidade de fazer comparações e uma razoável competência para a análise de variáveis como custo-benefício.
Do corredor dos chocolates e outras guloseimas, rumo para o de cereais. Pego um pacote de arroz e, sem conter a curiosidade, faço o caminho de volta, apenas para verificar se o tal senhor finalmente conseguiu fazer a sua escolha. É quando o flagro sacando o smartphone do bolso e fotografando uma barra de chocolate meio amargo. Na sequência, ele envia a imagem por WhatsApp para a mulher, seguida de uma mensagem de voz.
– Amor, é este chocolate que você pediu?
– Sim, é este mesmo. Pega a barra de um quilo!
O homem, então, pega o chocolate com inabalável convicção e marcha intrépido e decidido rumo ao caixa, como fazem aqueles que desconhecem o significado da palavra insegurança.
Graças à tecnologia, um casamento não sofreu abalo e a sobremesa de chocolate do almoço de domingo foi assegurada.
Foto: Ronei Thezolin
Manuel Alves Filho é jornalista e chef de cozinha