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Jundiaqui

 Salada musical bem temperadinha essa de Chico César
14 de março de 2023

Salada musical bem temperadinha essa de Chico César

Sem cadeiras, o ginásio do Sesc Jundiaí já dava a entender que a quadra se tornaria uma pista de dança. Dito e feito: com Chico César e sua incrível banda no palco, todo mundo entrou na dança. Entrou na cantoria. Soltou o riso, reviveu sucessos, conheceu boas novas, e por mais de duas horas curtiu os mais variados ritmos musicais que o paraibano propôs com maestria. E o público saiu dali certo de que a arte transforma nossa vida para melhor! E que ela é vital quando toca em temas profundos como racismo e violência social e política.

O show do novo álbum “Vestido de Amor” cobriu todas as fases da carreira do cantor e compositor com um colorido fantástico, passeio pelo frevo, toada, forró, soul, rumba, roquinho e até bolerão. Chique, o disco foi gravado na França, mas com sotaque bem nordestino, pegada latina e um pé ou mesmo os dois na África. Tudo junto e misturado.

Quem esteve em um dos primeiros shows dele, isso lá atrás nos anos noventa, e o reencontrou só agora, meu caso, tira o chapéu para a ascensão de sua sonoridade. Qualidade irretocável dele no domínio da guitarra ou violão e acompanhamento primoroso de uma banda que até tem professores universitários de música. Foi uma aula de percussão, sopros etc.

“Vestido de Amor” é o décimo disco de estúdio, de 17 lançados desde “Aos Vivos”, em 1995, isso sem contar os singles. Muitas parcerias pelo caminho nem sempre tranquilo, mas firme no propósito de divertir sem perder a chance de fazer refletir. Coisas de quem tem no sangue o jornalismo também.

Com tantos álbuns, não faltam canções em seu repertório, mas ainda assim ele foi emprestar sucessos de outros para delírio de quem esteve entre os 700 ouvintes/dançarinos/coralistas da noite deste 9 de março no Sesc, que em certos momentos reviveu bailinhos de garagem. Foi assim em “Não se esqueça meu amor, que quem mais te amou fui eu” ou em “filme triste, que me fez chorar”. Romantismo marca também a música de Chico César, que marcou a noitada com “Quando lhe achei, me perdi / Quando vi você, me apaixonei.”

O artista fez excelentes releituras, com fusões – não confundir com confusões, isso não se viu nem mesmo quando muita gente resolveu soltar o grito de “Lula, Lula!!!” em uma cidade recheada de eleitores de Bolsonaro; e lágrimas só se foram de emoção.

Por falar em política, cantou ainda “Bolsominions”,  sobre os que “saíram do inferninho direto pro culto” e emendou “bichos escrotos saiam dos esgotos”. A seguir pediu um coro de “ligue o foda-se, ligue o foda-se…” Foram muitos minutos seguidos com a plateia cantando só isso. Lembrou que sua mãe ficaria horrorizada, mas avisou: “Minha vida melhora quando eu ligo o foda-se”.

O colorido da roupa com que entrou no palco logo deu lugar ao branco da paz. Branco, por sinal, também era a maioria absoluta do público presente no Sesc Jundiaí. Curioso isso.

Ele chegou com uma espécie de roupão, que logo tirou por conta do calor quase sufocante, e um chapéu sem a ‘tampa’, deixando o cabelo pixaim todo para o alto. Coisa de quem tem uma “Mama África” e acredita que “Bob Marley pra sempre estará / No coração de toda a raça negra”. Chico César também já tem seu lugar na história que ele tanto briga para não deixar morrer e assim correr o risco de que se repita. Foi assim com “Caminhando e cantando / E seguindo a canção / Somos todos iguais / Braços dados ou não” ou “O negro segura a cabeça com a mão e chora. E chora, sentindo a falta… da Marielle”.

Com três mulheres entre os seis músicos e outras na iluminação e som, foi muito aplaudido ao lembrar que “lugar de mulher é onde ela quiser, seja no sax, na percussão”.

E como dançar é fácil com esse filho de Catolé do Rocha, interior da Paraíba, e seu grupo cantando e tocando… “Eu vou vestido de amor / Para o amor encontrar”. Teve quem se jogou para o alto de braços abertos em verdadeira demonstração de que o corpo é leve em voo e faz até a alma flutuar. Mas teve momento de tanta tranquilidade que ele até brincou se tinha um “baseado rolando ali no meio”, para emendar um reggae.

Foram cerca de 90 minutos de show, com Chico César até cantando à capela. Todos deixaram o palco sob o pedido de “bis”, que subiu de som para “BIS, BIS, BIS!” E a insistência valeu a pena. Eles voltaram não para mais uma música protocolar, mas quase outros 25 minutos de gostosuras musicais e de puro “Estado de Poesia” – “É belo vês o amor sem anestesia / Dói de bom, arde de doce / Queima, acalma / Mata, cria… / Chega tem hora que ri de dentro pra fora / Não fica nem vai embora / É o estado de poesia”.

Vale registros:

  • Quem abriu o show foi a DJ Maravilha de Jundiaí, que mandou seu recado com capricho.
  • O primeiro som que se ouviu da banda de Chico foi o do berimbaú.
  • Ainda no meio da primeira música (“Béradêro” – “Os olhos tristes da fita rodando no gravador”), um amigo brincou com o outro: “Já tá valendo mais que os 12 reais”. É que os ingressos foram de R$ 12, para quem tem carteirinha do Sesc, a R$ 40.
  • Ganhou palmas ao citar Paulo Freire, alguém que pensa as ideias, e dedicou o show a Naná Vasconcelos, que morreu em um 9 de março, isso em 2016.
  • Algumas das novas músicas foram feitas durante a pandemia que ele assegurou ter lhe deixado com “saudade de gente”.
  • Jundiaí foi falada quatro vezes por ele em agradecimento pela recepção. Quis ficar perto do público e até interpretou uma música sentado sobre uma das caixas de som bem na frente do palco e deu a mão para fãs.
  • As mulheres da banda são Simone Sou (percussão), há uma década junto com Chico César, Ana Karina (baixo) e Sintia Piccin (flauta transversal e sax). Tem ainda Gledson Meira (bateria) e Helinho Medeiros (teclados), que dão aulas na Universidade Federal da Paraíba, além de Richard Fermino (também no sopro).
  • Neste dia 25 tem mais, agora com Jards Macalé – mas fica esperto que é no teatro, ou seja, só 220 lugares.
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