
Dia da Maldade – Memória da cozinha
Pelo chef Manuel Alves Filho
Os terrenos baldios da minha infância eram mágicos. Bastava que pisássemos neles, para que se transformassem em campos de futebol dotados de balizas demarcadas por chinelos de borracha, aqueles que soltavam completamente as tiras quando chutávamos a bola de “capotão”. Meu time não tinha muitos craques, mas contava com jogadores dedicados. Dávamos o sangue e o suor pela equipe. Época em que os adversários eram somente os opositores que davam sentido ao jogo. Não eram inimigos, como muitos consideram nestes tempos obscuros.
Assim que os grandes clássicos entre os escretes que representavam as ruas do bairro terminavam, eu corria para casa para tomar banho e almoçar. A comida era sempre singela, mas invariavelmente deliciosa. O velho Neco, meu pai, era uma espécie de Zico da cozinha. O cara tinha parte com as divindades dos temperos. Batia um panelão, com o perdão do trocadilho. Um dos pratos que Neco fazia com frequência era a brachola, também conhecida como bife à rolê.
Ele recheava os bifes de coxão duro com o que tinha à mão. E ainda acrescentava batatas, que não compõem a receita original, mas que elevam o grau de sustância da preparação. Ah, que belo repasto!
Hoje, reproduzi o cardápio (foto), que me serviu de almoço. Recheei os bifes com tiras de linguiça espanhola e cebola roxa. Estas liberaram um sabor especialíssimo para o molho feito somente com tomates maduríssimos, alho, cebola, azeite, pimenta dedo-de-moça e tomilho fresco. Pai, acho que hoje fiz um daqueles gols que você marcava com os pés nas costas.